5 de abril de 2008

Das verdades e mentiras!

Artigo de autoria de Geraldo Filho (Sociólogo, Bchl e MSc: professor do CMRV/UFPI, Coordenador de Pesquisa e Pós-Graduação)

Não é possível dizer sempre verdades, pois é o caminho certo para situações inconvenientes, nas quais o amante das verdades terminará por se tornar um chato e, conseqüentemente, isolado.

Por outro lado, aquele que vive em um mundo de mentiras tem um destino parecido com o seu parceiro das verdades puras, a solidão dos chatos, pois ninguém agüenta ficar muito tempo ouvindo suas petas.

Recomendo, pois, o bom senso diante da vida, nem tanto às virtudes de Sócrates/Platão nem tanto a sabedoria matreira de Pedro Archanjo (em Tenda dos Milagres, de Jorge Amado); nem tanto o estoicismo de Cícero e Sêneca nem tanto o sensualismo do Marquês de Sade (sinônimo do hedonismo moderno). O ideal é evitar o sofrimento, como Epicuro, então deve-se misturar meias-verdades com meias-mentiras.

Isso pode parecer cinismo, mas prefiro ver como um modo prático de viver a vida, pois no cotidiano das relações humanas é assim que acontece! Deve ficar claro, porém, que há um limite para as verdades e as mentiras parciais: elas não devem prejudicar a ninguém. Como conseguir isso?! Através da razoabilidade, que é uma avaliação do tipo custo/benefício.

Imagine você contar para o seu amor que encontrou na rua o(a) ex que ele(a) odeia?! Imagine dizer para um(a) gordinho(a), que luta com a balança, que seus esforços até então foram inúteis?! Ou para uma mulher, sem bumbum, que sua minissaia não lhe cai bem?! Todas situações desagradáveis, que podem CUSTAR uma amizade, sendo preferível, portanto, calar ou elogiar, ao invés de dizer realmente a verdade, e assim manter o BENEFÍCIO da amizade. Quem saiu prejudicado?!

Como deixei de dirigir há 25 anos, depois de um acidente de automóvel, sirvo-me de táxis e mototáxis nas cidades por onde ando. Evidentemente que alguns são de absoluta confiança, pois já correm comigo faz muito tempo, o que termina por constituir amizade entre cliente e motorista.

Numa manhã de 2007, quarta-feira de novembro, fui surpreendido na minha residência de trabalho, no horário do café (portanto, já um horário estranho), com uma ligação de celular de um desses motoristas fiéis. No telefone, pediu-me para falar algo urgente, e tinha de ser ao vivo, não por celular, pois estava muito aperreado. Diante da circunstância, aquiesci, e disse que poderia recebê-lo.

A princípio, imaginei que fosse dinheiro, o que me deixou de mau humor, pois depois de degustar o café matinal em seguida passo a leitura dos livros e revistas, durante toda manhã (quando não estou malhando na academia), e naquele dia iria começar minha rotina de trabalho tendo que inventar uma desculpa para não emprestar dinheiro, pois diante daquele alvoroço todo só podia ser isso, pensava eu.

Passado alguns minutos, palmas no portão. Fui atendê-lo e de fato o motorista estava lívido, mistura de pressa e ansiedade: “Professor, professor... preciso de sua ajuda. É a mulher professor! Ontem, de noite, eu fui dar uma voltinha, o senhor sabe... uma namoradinha... e aí a danada da mulher desconfiou e eu disse que tava fazendo um serviço pro senhor, fui lhe deixar numa solenidade. Mas, não teve jeito, ela disse que ia tirar essa história a limpo e confirmar com o senhor.”

Nessa hora, minha cabeça desanuviou, do mau humor passei ao cômico da cena e vislumbrei uma boa história para contar numa roda de uísque e cerveja. Então, ele arrematou: “Dá pro senhor confirmar minha história?!” Tentei acalmá-lo, argumentando que ela não faria aquilo, pois foi somente um momento de raiva e exaltação, no entanto, nada o convenceu: “Professor, ela vai ligar.”

Meia hora depois, toca o telefone e fala uma mulher: “É o professor Geraldo Filho? Olhe, eu sou a mulher do fulano de tal... É que ele é sem-vergonha, professor, gosta de pular o muro, e ontem disse que tava fazendo um trabalho pro senhor, é verdade?!” Tomei um susto com a audácia da mulher que, sem nos conhecermos, tentou me envolver em seus problemas pessoais e conjugais.

Ora, conhecendo a máxima: “Briga de marido e mulher não se mete a colher”; apliquei a razoabilidade do bom senso: “Mas, o que foi que aconteceu, ele está bem, houve algum problema, algum acidente?! De fato, ele prestou serviço ontem para mim numa solenidade, etc...” Foi, água fria na fervura irada da mulher. Hoje, estão a mil maravilhas, por pouco mais de meia hora a verdade não estragou um casamento!