As eleições no
Período Imperial
Os municípios
brasileiros convivem nesses meses com uma agitação peculiar e
apaixonante: as eleições municipais. Pelo conhecimento, proximidade
e parentesco com os candidatos, estas eleições sempre foram muito
mais motivadoras e empolgantes para os eleitores.
A Justiça Eleitoral
nos últimos pleitos tem adotado medidas que visam promover uma certa
equidade entre os candidatos (eliminando os showmícios, camisetas,
trio elétricos, bonés, etc.) o que na visão daqueles que
acompanham de perto a trajetória das campanhas eleitorais em nível
municipal, acabaram com o “brilho da festa”...
E de onde advêm tanta
paixão? Porque eleger prefeitos e vereadores mexe tanto com os
nossos sentimentos? Quando iniciou todo esse ciclo histórico?
Desde o Período
Colonial os chamados “Homens Bons”(Vereadores) já eram
escolhidos entre a aristocracia local, longe de qualquer processo
legal ou democrático. Era uma simples formalidade para homologar a
manutenção da elite do poder local.
O aparecimento das
primeiras normas constitucionais para os pleitos surgem com o
primeiro reinado, que estabeleceu um sistema eleitoral (1824) onde a
renda do cidadão era ponto chave para sua habilitação e
participação como eleitor ou candidato (voto censitário). Para ser
Eleitor de Paróquia (as paróquias eram as unidades territoriais da
vida eleitoral) o cidadão teria que comprovar uma renda líquida
anual de no mínimo Rs100$000 (cem mil réis) alterada para Rs200$000
(duzentos mil réis) em 1846, renda esta que deveria ser fruto de
emprego, comércio, indústria ou propriedade de terra, idade mínima
de 25 anos, exceção feita aos casados, clérigos, militares e
bacharéis formados.
Como o sistema
eleitoral era indireto, o Eleitor de Paróquia escolhia o Eleitor de
Província que por sua vez deveria possuir que uma renda líquida
anual de Rs200$000 (duzentos mil réis) e ficava na obrigação de
eleger deputados que deveriam declarar renda de Rs400$000
(quatrocentos mil réis) e Senadores com renda de Rs800$000
(oitocentos mil réis). Os deputados eram eleitos entre os mais
votados e os candidatos ao Senado eram submetidos a uma lista
tríplice por província, para a escolha do Imperador, que indicaria
aquele que ocuparia a sonhada vaga de senador vitalício.
Esse sistema eleitoral
era extremamente elitista e excludente pois ficavam de fora os
pobres, as mulheres, os praças, os religiosos de clausuras e
analfabetos que ganharam direito de voto em 1882 e perderam com a
República em 1889.
Como não havia
estabilidade para o funcionalismo público, as sinecuras (cargos e
postos públicos) eram preenchidas por interesses dos eleitos locais
(o que ainda não mudou muito) e até mesmo os juízes togados, que
tinham postos vitalícios, temiam remoções para locais distantes e
inóspitos, fazendo por comodidade, muitas vezes, o jogo de quem
estava no poder. O que dizer então, dos Juízes de Paz, que eram
eleitos em nível local para resolver pequenos conflitos e manter a
ordem, uma vez que não havia prefeitos e as vilas e cidades eram
administradas por 7 a 9 vereadores, respectivamente, que viviam sob a
batuta dos coronéis e fazendeiros, na realidade os verdadeiros donos
do poder!
As eleições
municipais da época eram marcadas, paradoxalmente, pela presença de
capangas, jagunços, pela fraude, a intimidação, a violência e
pela religiosidade da Igreja Católica, que revestia o ato eleitoral
de uma sacralidade que envolvia o próprio templo religioso como
local para realização das eleições. Antecipando o pleito, já no
dia anterior era realizada uma Missa ao Espírito Santo, onde no
sermão rogava-se tolerância e iluminação aos eleitores e
candidatos. O local e as rezas não impediam que, na maioria das
eleições, o uso da violência fosse utilizada por aqueles a quem
era “vergonhoso perder as eleições”. Por isso, os padres
tomavam uma série de cuidados como retirar o Santíssimo Sacramento,
as imagens, os castiçais que eram guardados na Sacristia que ficava
rigorosamente fechada para evitar irreverências, tumultos e as
profanações, não raras acontecer nessas ocasiões, uma vez que o
alistamento do eleitor era feito no dia e local da eleição, as
cédulas eram identificadas com a assinatura do eleitor e o voto por
procuração era a arma dos coronéis para “resolver” as questões
de desempates e margens de vitória.
Tentando acalmar os
ânimos o vigário cantava o Te Deum após as eleições. Somente em
1881 com o estabelecimento de eleições diretas (Lei Saraiva) as
cerimônias religiosas foram dispensadas de acompanhar o processo
eleitoral.
É importante que
conheçamos nossa trajetória histórica e tratemos cada pleito
eleitoral como processo didático, corrigindo erros, buscando avanços
e acertos, nesse caminho longo e sofrido na luta por uma plena
democracia.
Prof. Dr. Iweltman
Mendes
Iweltman Mendes é
professor doutor da UFPI e da Faculdade Internacional do Delta –
INTA/Parnaíba