Todo povo excessivamente convicto de
suas qualidades torna-se arrogante, e o inverso ocorre com um povo
que só acha que tem defeitos e se julga cheio de defeitos e se
aceita como inferior naturalmente.
Os denominados países desenvolvidos
firmam os valores para todos os demais. Os ingleses são reconhecidos
e admirados pela pontualidade. É comum ouvir-se a expressão
“pontualidade britânica”. Os japoneses firmaram-se como os
melhores em transformar tudo que for gigante em miniatura. Os
americanos em fazerem justiça, especialmente no terreiro alheio. E
os brasileiros em darem um jeitinho.
Este arranjo tem por objetivo corrigir
o que não se faz bem-feito, ou em tempo certo. Quando se refere a
prazo, o que demandaria um mês se realiza no último minuto de um
ano. Por isso, faz-se de atropelo e erra-se por demais. Daí vem a
necessidade de corrigir, via de regra, de forma a burlar as regras
legais e de segurança. Muito raro o jeitinho ajuda. Como regra, é o
símbolo maior do atraso deste país.
Como nada ocorre por acaso, essa
conduta nacional se firmou por ser valorizada em alguns setores
sociais. Por muito tempo o malandro do samba carioca foi enaltecido.
Morava em bairros pobres, fumava e bebia muito, vestia-se de branco,
usava chapéu e, de quebra, era o verdadeiro gigolô de mulheres
ricas.
No futebol também se cultua em demasia
a malandragem. Os comentaristas entusiasmam-se com as artimanhas.
Jogadores que simulam sofrer faltas penais e fingem sofrer agressões
para forçarem a expulsão dos adversários. Não são válidos
dribles para enganarem os adversários. São artifícios para levarem
vantagens indevidas, coroadas com uma mensagem do ex-jogador Gérson
para se levar vantagem em tudo.
Esse comportamento desleal
generalizou-se e passou a integrar às atitudes do dia-a-dia dos
cidadãos como sinônimo de inteligência e criatividade.
Quem trabalha em empresa ou tem
profissão que permite andar em ônibus sem pagar, nunca mais banca
suas passagens, mesmo depois de perder esse direito. Usa o uniforme,
o crachá, dá a famosa carteirada. Procedimento que se repete na
entrada em cinema, em teatro, em jogo de futebol, com a famosa
meia-entrada.
Nas grandes cidades é comum o
motorista permitir a venda no interior dos ônibus em troca de um
salgadinho ou doce jogado, rápida e de forma despretensiosa, depois
da descida do ambulante. Isso é corrupção dissimulada, pois sem a
troca, sua entrada não seria permitida. Por essas e outras,
advogados brasileiros não fazem defesas da justa pena, mas da
impunidade, mesmo conhecedores da culpabilidade de seus clientes,
similar à defesa feita pelos procuradores dos mensaleiros de que
seus clientes “só” praticaram o caixa dois, numa alusão
espantosa de crime menor.
Com tantos desvios, cobra-se ética de
parlamentares e de políticos em geral, que deve mesmo ser cobrada,
mas a ética tem que fazer parte de todos os atos da vida das
pessoas, sem exceção. Essas condutas devem ser reprovadas por serem
desonestas e prejudiciais à nação. Glamourizar esses desvios de
conduta confunde e distorce os valores éticos de um povo, que define
como um “jeca” quem defende a honradez e pontualidade.
Pedro Cardoso da Costa - Interlagos/SP
Bacharel em Direito