Vicente Potência |
Recordo-me do ano 1979, quando em Teresina, intelectuais ligados a Academia Piauiense de Letras, promoveram uma campanha de menoscabo a importância do movimento brasílico em Parnaíba, que culminou com a proclamação da Independência do Brasil no Piauí, em 19 de outubro de 1822, data essa instituída em Lei proposta pelo Deputado José Auto de Abreu, como o Dia do Piauí. O objetivo principal daqueles ilustres senhores, foi a tentativa de mudança da data maior do calendário cívico a nível de Estado, para 24 de janeiro de 1823, data da adesão à Independência do Brasil, por brasileiros de Oeiras, a capital da Província.
A reação na Parnaíba, foi imediata e objetiva, através de manifestações vibrantes de vários segmentos da sociedade, onde se destacaram as pessoas de Anchieta Mendes, Lauro Correia, Canindé Correia, Reginaldo Costa, Sólima Genuína, entre outras. Também, participei escrevendo um artigo no Jornal Inovação com o título “A Respeito da Independência no Piauí” , do qual, destaco para conhecimento nos dias atuais, o seguinte trecho da série “ MISSIVOS PARA SIMPLÍCIO DIAS” , uma correspondência imaginária com o defensor maior das causas brasílicas na então província do Piauí :
“ Ora, Fidalgo, essa plêiade de intelectuais que quer apagar o escrito em 19 de outubro de 1822, sabe muito bem, em sã consciência, que aderir não é principiar. E, é exatamente dentro deste contexto, que, está inserido o 24 de janeiro de 1823 – data da adesão – quando o então governo civil da Província do Piauí, já pressionado pela arregimentação de tropas das lideranças parnaibana, cearense e baiana, não resistiu a sublevação de Oeiras, levada a cabo pelo grupo adesista comandado pelo Brigadeiro Manoel de Souza Martins.
É estranho, Coronel Simplício, o porquê deste atentado ao brio e tradição do povo piauiense, quando o próprio grupo contestador é sabedor dos fatos que geraram aqui na Parná, o brado de Independência do Piauí, aceito posteriormente por toda a Província.
Assim sendo, todos sabemos que a promulgação dos decretos nos 124 e 125 da Corte Portuguesa, datados de 29 de setembro de 1821, através dos quais, o Brasil perdia a condição do Reino-Unido, provocaram o elenco de ocorrências que culminaram com os acontecimentos de 7 de setembro de 1822, em São Paulo e 19 de outubro de 1822 em Parnaíba.
Muitas são as razões que me levam a acreditar que por trás dessa intenção dos nossos historiadores em questão, está oculta a grande cartada para provocar a polêmica em torno do assunto, promovendo com isto, o estudo da História do Piauí, até hoje, pouco conhecida pelo seu povo.
Porém, a mais forte de todas, é a seqüência de fatos que se sucederam ao longo do movimento, dentre os quais, para confirmação do 19 de outubro de 1822, como data mágna da Independência do Piauí, destacam-se:
1. A articulação política na Região Sul, que provocou o Dia do Fico;
2. A incrementação da campanha de emancipação política em nível nacional, que, teve como desfecho o manifesto de D. Pedro, em 1o de agosto de 1822, no qual anunciou que mandara convocar a Assembléia do Brasil-Reino, com o intuito de solidificar a Independência Política da Nação, sem romper os vínculos de fraternidade portuguesa;
3. A chegada do Sargento-Mor João José da Cunha Fidié, a Oeiras, o qual assumiu o Governo das Armas em 9 de setembro de 1822, com a finalidade de implantar a política das Cortes Portuguesas – conseqüência dos decretos nos 124 e 125 - objetivando conservar pelo menos a região norte do Brasil como Colônia, visto que era inevitável a Independência política do país;
4. A visualização pelos conspiradores parnaibanos dos objetivos de Fidié, com a remessa de armas para Oeiras;
5. O ofício do Dr. João Cândido, de 30 de setembro de 1822, informando à Junta de Governo do Piauí que a Vila de Granja-CE (próxima a Parnaíba), já proclamara D. Pedro “PROTETOR E DEFENSOR DO BRASIL”, e demonstrava sua posição em relação ao movimento separatista, com os dizeres: “A melhor, a maior, a mais rica, a mais populosa parte do Brasil tem-se declarado a favor da causa da Independência; como persuadir-nos que o resto não siga a mesma causa”;
6. A Junta de Governo do Piauí, em 6 de novembro de 1822, toma conhecimento do evento de Parnaíba, e, em 13 do mesmo mês, o Governador das Armas, Fidié, já estava a caminho do foco libertário com a tropa e armas que pode arregimentar;
7. A chegada do vaso de guerra infanto D. Miguel – enviado pelo Governo do Maranhão – e a marcha de Fidié com destino a Parnaíba, provocaram o deslocamento estratégico dos líderes parnaibanos ao Ceará, com a finalidade de recrutarem combatentes, e, de volta, sitiarem o inimigo na área em que o povo já despertava para a importância do movimento;
8. O florescimento em Oeiras da idéia de adesão à Independência, inclusive com atos de sabotagem em dezembro de 1822;
9. A invasão de Piracuruca em 22 de janeiro de 1823, por Leonardo de Carvalho Castello Branco, componente do movimento de Parnaíba , a frente de combatentes recrutados no Ceará;
9. O conhecimento da Junta do Governo em janeiro de 1823 de que Crateús, pertencente ao Piauí naquela época, já lutava a favor da emancipação;
10. A tomada do Governo do Piauí, em 24 de janeiro de 1823, por elementos adesistas, os quais, comunicaram as câmaras municipais da província que elas deveriam reconhecer em D. Pedro “O IMPERADOR CONSTITUCIONAL E PERPÉTUO DEFENSOR DO BRASIL”;
11. A correspondência da Junta Interventora enviada ao Dr. João Cândido,datada de 26 de janeiro de 1823, na qual ele era convidado a deslocar-se para Oeiras a fim de dar orientações no destino político da Província;
12. A tomada de Piracuruca por Leonardo Castelo Branco em 22 de janeiro de 1823,o combate na Lagoa do Jacaré (Piracuruca) , e a Batalha do Jenipapo em Campo Maior, em 13/03/1823;
13. O enfraquecimento do poder de fogo da tropa de Fidié, com o roubo de provisões e armas efetuados por soldados cearenses durante o combate, o que provocou a fuga de Fidié para o Maranhão, onde, posteriormente, foi derrotado em Caxias;
14. O retorno de Simplício Dias a Villa da Parnahiba, que a frente da tropa organizada e mantida a suas custas, expulsou da Villa da Carnaubeira os europeus constitucionalistas de Parnahiba, que se haviam refugiado naquela ilha do Maranhão, sob a proteção do aparato militar português de tropa de 1ª Linha, duas sumacas armadas, o brigue de guera Infante D. Miguel e três canhoneiras, consolidando-se então, a Independência Política do Piauí, no âmbito da nação brasileira.
E assim, Simplição, para ratificar o meu ponto de vista e terminar esta missiva, tu deves te lembrar muito bem, que em retribuição ao apoio que deste à causa da Independência do Brasil, D. Pedro de nomeou Presidente da Província, cargo que deixaste de assumir por livre e espontânea vontade.”
Cordialmente,
DEPAULA
Inovação, novembro 1979 – 24ª edição
Os Europeus Constitucionais desta Vila, com outros de Maranhão se haviam refugiado, e fortificado no lugar Carnaubeira sete léguas de distância à margem do rio, tendo tropa de 1ª linha do Maranhão duas sumacas armadas, o Brigue Infante D. Miguel, e três canhoneiras com as quais devastando o rio, e esta Vila causaram os maiores estragos e pavor aos povos. Esperavam os inimigos tropas de Portugal; era seu plano, e do Governo do Maranhão para tornarem a atacar, e fortificar-se nesta mesma, Vila, a fim de poderem do novo invadir todo o Piauí, entrar no Ceará, e seguirem até Pernambuco. Vi a necessidade de prevenir projeto tão arriscado, antes que se realizasse a vinda dos Batalhões Lusitanos, dispus conseqüentemente as tropas que tinha apesar da falta de pólvora, foi acometida inopinadamente a Carnaubeira, com tal denodo que os inimigos aterrados um só tiro não tiveram valor de disparar, fugiram para o Maranhão nas embarcações, levando todos os seus efeitos, e muitos a (…) como os cofre dos órfãos, e os (…) que para ali haviam conduzido em reféns, no tempo do major Fidié. Não menos eficaz fui para que o grito da Independência, e o Augusto nome de Vossa Majestade Imperial ressoasse em outras Vilas da Província do Maranhão, contribuindo portando fortemente para enfraquecer o partido Constitucional Lusitano, que obstinadamente resistia naquela cidade, e facilitando o triunfo da Independência, quando foi vista a Nau D. Pedro. E ainda assim me dispus a marchar em tropas desta Vila para aquela cidade, unido ao capitão-mor Filgueiras, a destruir as cabalas perigosas que o partido Europeu suscitava, ameaçando uma revolta do que desistimos pela eleição do benemérito Governador de Armas o capitão-mor Rodrigo Luís Salgado de Sá Moscoso, cujo patriotismo e probidade soube por termo às desordens.
Por Vicente de Paula Araújo Silva “Potência”