Sob o argumento
principal de que liberdade tem limites, o juiz da 35ª zona
eleitoral, Flávio Saad Peron, de Mato Grosso do Sul, determinou a
prisão do representante do google no Brasil por não ter retirado
uma propaganda do site Youtube no prazo estipulado pelo magistrado
sob a alegação de ofensa de um candidato ao outro. Não se vai
tratar aqui do caso específico, mas da série de decisões pela
Justiça Eleitoral por todo o país no mesmo sentido.
Com um olhar apenas sob
este argumento parece ser inquestionável o acerto do magistrado, já
que toda decisão judicial deve, em tese, ser cumprida. Ocorre que a
discussão deve ser colocada sob o cerne da questão, sobre o chamado
bem a ser protegido.
Parece ter se tornado
certo modismo proibições de falas e de vídeos nas rádios,
televisões e na Internet daquilo que os juízes definem de ataques
pessoais ou de tentativa de difamação entre os candidatos. Ainda
que toda decisão judicial deva vir acompanhada de fundamentação,
seria preciso analisar melhor esses enquadramentos e especialmente se
são casos de vedações legais.
Na Bahia foi proibida a
exibição da fala do candidato a prefeito Antônio Carlos Magalhães
Neto prometendo com clareza insofismável de que daria uma surra no
presidente Lula. Haveria agravo se fosse um fato mentiroso, mas não
resta dúvida quanto a sua afirmação categórica. Os defensores do
candidato alegam que foi em outra época. Nada muda. Suas virtudes
relatadas também são de outras épocas e visam angariar votos, já
o contrário não pode. Se como deputado ele seria capaz de surrar um
presidente da República, seria uma incógnita o que ele poderia
fazer com um munícipe que o desagradasse quando prefeito. Não teria
o privilégio do pioneirismo, já que todas as TVs exibiram o
prefeito recém-eleito Gilberto Kassab xingar e expulsar aos berros
um cidadão de um hospital.
Pela lógica do
raciocínio dos magistrados, os adversários de José Serra não
poderiam exigir a Escritura, registrada em cartório, que dava
garantia do cumprimento integral do mandato como prefeito de São
Paulo. Saiu na metade. E essa já seguia uma outra de Antônio
Palocci, sempre ele, também não cumprida. Com Marta Suplicy
candidata, mesmo em atendimento a um pedido dela, qualquer um que
relaxasse e gozasse seria punido. Pela mesma lógica, seriam punidos
toda reprodução sobre a afirmação de Paulo Maluf de que
professoras não ganham pouco, são mal casadas. Muito menos
mencionar que ele não pode sair do Brasil sob o risco de captura
pela Interpol.
Do governo de Fernando
Henrique Cardoso seriam proibidas também as afirmações de Rubens
Ricúpero de que só se deve mostrar as boas ações e esconder as
ruins; a de ex-ministro de FHC Luiz Carlos Mendonça de Barros ao
mencionar que estavam transpondo o limite da irresponsabilidade,
quando o governo era acusado de direcionar uma das privatizações
para um determinado grupo de empresários.
Das mais recentes,
nunca poderiam ser reexibidas as cenas dos deputados distritais e do
ex-governador arrumando a enfiar dinheiro por todo canto do corpo.
Nem se cogite mencionar a mansão de Palocci em Brasília - de novo,
ele – de sua riqueza multiplicada por 20 em quatro anos.
Precisa-se estabelecer
outros parâmetros para definir ofensa à honra, ou quando os ataques
caracterizam difamação. Nos exemplos citados a grave estaria no
conteúdo do que disseram seus protagonistas e a reprodução é
parte inerente de apontar as condutas e personalidade dos envolvidos.
Como age a Justiça Eleitoral hoje, só as vantagens podem ser
retratadas, ainda que inverídicas, já o lado negativo não pode
integrar as campanhas eleitorais. É hora de repensar esse modelo de
atuação jurídica de mão única. Assim o Poder Judiciário, a
pretexto de combater comete abusos, mata o direito à liberdade de
expressão, além de se tornar o protetor-mor dos maus
administradores públicos, já que seus passados comprometedores não
podem ser relembrados.
Pedro Cardoso da Costa
– Interlagos/SP
Bacharel em Direito