27 de março de 2009

Piauí x Ceará: A luta pelo território da Amarração


Iweltman Mendes - Professor da UFPI, FAP e FID – Membro da APAL e IHGGP

Todo o esforço pela obtenção de um porto para o Piauí na barra da Amarração, chocava-se com uma realidade que há séculos já deveria ter sido definida, mas que ainda arrastava-se pelos idos de 1853: A quem pertencia geográfico-politicamente a região da Barra da Amarração? À Província do Ceará ou à Província do Piauí?

Enquanto a questão não encontrava uma solução, o Governo do Piauí, na pessoa do Governador Antônio Francisco Pereira de Carvalho vai executando ações como se o território em questão fosse decididamente piauiense. Nomeia em 1853 o primeiro prático para o Porto de Amarração e adota providências para a instalação da Capitania do Porto, criada pelo Decreto nº 1.552, de 10 de fevereiro de 1855, com sede na cidade de Parnaíba a quem se julgava que o território da barra de Amarração estava sob seus limites. Os governos piauienses que se sucedem continuam fazendo gastos com o Porto de Amarração, partindo do mesmo entendimento, ou seja: que o território de Amarração pertencia ao Piauí. O Governador Frederico de Almeida Albuquerque, no ano de 1856 nomeia novos práticos para o Porto de Amarração e adquire catraias e escaler para a Capitania do Porto. Outro governador, que, partindo do mesmo entendimento, fez gastos com o Porto de Amarração foi Franklin Américo de Menezes Dória, que no ano de 1864 ordenou ao Capitão do Porto de Parnaíba a edificar em Amarração uma torre de madeira com lampiões que serviria de baliza para orientar os navegantes à noite, fazendo as funções de um farol. A fragilidade da torre de madeira levou, posteriormente (1873), o Ministério da Marinha a construir o farol da Pedra do Sal.

No Piauí, o tema da posse do território da barra da Amarração é levado à discussão na Assembléia Legislativa Provincial, em sessão de 16 de julho de 1860, em que foi requerida a nomeação de três membros da Assembléia para elaborar uma representação dirigida à Assembléia Geral do Império, traçando em definitivo os limites entre as províncias do Piauí e do Ceará e passando a posse da barra da Amarração para a Província do Piauí. Em 18 de novembro de 1862, a Assembléia Piauiense volta a manifestar-se sobre o assunto, na pessoa do Deputado Aureliano Ferreira de Carvalho, que insiste na nomeação de uma comissão de três membros para formular uma representação junto à Assembléia Geral do Império, sobre a conveniência do alargamento da Província do Piauí, em seu litoral, da foz do Rio Parnaíba até a Foz do Rio Timonha. Os piauienses pretendiam um desfecho rápido e, logicamente, favorável a sua província.

Em meio às discussões sobre a quem pertencia a posse do território da barra da Amarração, a Assembléia Legislativa da Província do Ceará, pela lei nº 1177, de 20 de agosto de 1865, cria o Distrito de Amarração, vinculado politicamente ao Município de Granja, oficializando a posse cearense do território de Amarração.

Após a investida cearense sobre nosso pretendido porto, o assunto volta à discussão na Assembléia Legislativa Provincial do Piauí, que em 20 de setembro de 1867, levou o Deputado Miguel Borges a requerer a formação de uma comissão de três membros para que esta comparecesse à Assembléia Geral do Império com o esboço de um projeto que estabelecia em definitivo os limites da província do Piauí com o Ceará, principalmente nas áreas mais litigiosas: Costa Marítima, Serra da Ibiapaba e Barra do Rio Timonha. E assegurar como piauiense o litoral compreendido desde a foz do Rio Timonha à Barra das Canárias.

Comungando com essa luta em defesa de um porto para o Piauí, o presidente da província, Manoel José Espíndola Júnior, em Mensagem que remeteu à Assembléia Legislativa, em 1 de julho de 1870, deixou registrado: “(...) Convém, entretanto, não esquecer que esse futuro depende em parte de ter a província um porto sobre o oceano, o qual poderá conseguir, restituindo-lhe o Ceará o terreno da Amarração, que de direito lhe pertence.” (Espíndola Júnior, In: Mendes – Navegação no Piauí – Dicionário Histórico Geográfico – Obra inédita - p.78)
Mas a província do Ceará ignorava as pretensões piauienses, proclamando em 5 de agosto de 1874, a Lei nº 1596, que elevava o Distrito de Amarração sob a jurisdição do Município de Granja, à categoria de vila, assegurando cada vez mais o pretendido território do porto piauiense para o Ceará.

A questão só ficaria resolvida em definitivo, após rodadas de negociações, e com a publicação do Decreto Imperial nº 3.012 de 22 de outubro de 1880, que estabelecia a permuta dos municípios piauienses de Príncipe Imperial (hoje Crateús) e Independência pelo território de Amarração (hoje Luís Correia) até a foz do Rio Timonha, no atual município de Chaval.

Eis o Decreto:

Art. 1°. E anexada à Província do Ceará o território da Comarca de Príncipe Imperial, da Província do Piauí, servindo de linha divisória, das duas províncias, a Serra Grande, ou da Ibiapaba, sem outra interrupção além da do Rio Poti, no ponto Boqueirão, pertencente á Província do Piauí — todas as vertentes ocidentais da mesma serra, nesta parte, e á do Ceará as orientais.

Art. 2°. Fica pertencendo á Província do Piauí a freguesia da Amarração, com os limites que estabeleceu a lei provincial do Ceará, nº 1.360, de 5 de Novembro de 1870, a saber: da Barra do Rio Timonha, Rio de S. João da Praia, acima, até a barra do riacho que segue para o Santa Rosa e dali, em rumo direito á Serra de Santa Rita, até ao pico da Serra do Cocal (dos Cocos) termo do Piauí.

Art. 3°. A linha divisória eclesiástica será idêntica á civil, que fica estabelecida, sendo o governo autorizado a solicitar da Santa Sé as necessárias Bulas.

Com a rubrica de S.M o Imperador, etc.— Barão Homem de Mello. ».