A vitória da candidata Dilma Rousseff foi um passo importante e fundamental para consolidação da democracia reiniciada em 1989, após 21 anos de ditadura militar. De lá pra cá o Brasil amadureceu e avançou em seus propósitos. Foi capaz de superar crises econômicas e políticas sem pôr em risco as instituições; sofreu reformulações, mudanças e pode escolher livremente seus representantes. A liberdade de expressão e de pensamento prevaleceu sobre o arbítrio e a censura de antanho. Enfim, se durante décadas ouvimos que o Brasil era o país do futuro agora, finalmente, esse futuro não é apenas uma luz ao fim do túnel, mas a realidade que só não vê quem faz de conta que não enxerga.
Neste processo, só não fomos capazes de aprimorar o conteúdo dos discursos e debates eleitorais. Pela enésima vez é preciso repetir que a eleição de 2010, principalmente no segundo turno, foi a mais leviana, suja e sórdida dos últimos anos, onde prevaleceu a mentira, a farsa e os interesses das elites retrógradas. A chamada grande imprensa, ao invés de pautar a discussão de temas voltados aos interesses nacionais, desta vez expôs sem qualquer escrúpulo ou pudor sua carranca na tentativa de servir como instrumento a disseminar os efeitos devastadores da mentira.
Não menos surpreendente foi a postura dissimulada do candidato tucano, José Serra. Seu passado de homem público esteve pautado pelo discurso progressista, na defesa da democracia e seus valores. Exilado político no Chile foi vitima da ditadura militar tanto aqui como lá. E todos sabem do que são capazes os ditadores. Mas agora, na ânsia de buscar a vitória a qualquer preço, Serra se uniu e praticou tudo aquilo que sua biografia até então aparentava rejeitar. Arrastou consigo a nata do conservadorismo, aliou-se a mesma elite que no passado o expulsou do país. Buscou guarida no fundamentalismo religioso e foi capaz de falsear uma fé que publicamente jamais professou em outras campanhas. Aliás, uma cena em Foz do Iguaçu, PR, quando se postou à frente numa convenção de pastores evangélicos é o retrato da falácia, da mentira, da extorsão. Assumiu não só a postura como encarnou o discurso da moral e dos bons costumes ao acusar a então candidata Dilma Rousseff de ser favorável ao aborto. Mas foi traído pela denúncia que sua mulher Monica Serra, no exílio, havia feito um aborto. Jamais desmentiu o fato ou permitiu que ela falasse sobre o tema. Exceto uma nota publicada na Folha de S. Paulo, os jornais e revistas aliados a sua candidatura não imprimiram em seus periódicos uma linha sequer sobre o assunto. Após esse fato o tema aborto simplesmente desapareceu do debate. Pergunto eu: uma mulher vítima de acusação falsa, leviana e grave como essa ficaria calada ou buscaria seus direitos na Justiça? Ou quem cala consente?
Felizmente o processo democrático pressupõe a vontade da maioria e permite que a sociedade escolha pelo voto o seu presidente da República. Nesse caso, a nova presidente. Duas propostas distintas estavam em jogo e os eleitores optaram pela continuidade de um projeto preocupado com as questões sociais; onde os números, as realizações, as vantagens ou desvantagens desse modelo, assim como a aprovação ou reprovação do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva não se resumem a estatísticas publicadas em estudos acadêmicos ou pesquisas de opinião pública. Basta caminhar pelas ruas e conversar com o povo.
A derrota de Serra serviu para demonstrar que o Brasil consolidou de fato sua democracia. A “elite branca” acostumada a impor goela abaixo seus interesses em cumplicidade com setores da imprensa dessa vez tropeçou na própria farsa. O lixo resultante da campanha só é útil para engrossar o folclore político nacional. Se estivesse vivo, o jornalista Sérgio Porto – Stanislaw Ponte Preta – teria assunto de sobra para reeditar uma nova versão de sua imortal obra “O Festival de Besteira Que Assola o País – FEBEAPA”.
Por René Ruschel - Jornalista em Curitiba-PR
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